Terra, dignidade e justiça: conciliação histórica transforma vidas em Brasilândia de Minas

Uma foto de grupo tirada em um ambiente interno formal. Um grupo de dez pessoas está posando em pé atrás de uma mesa grande de madeira escura. A maioria dos homens veste trajes formais, e há uma mulher à esquerda em trajes sociais. A parede de fundo é revestida de madeira.

Uma conciliação histórica colocou fim a um conflito fundiário que se arrastava há anos, oferecendo uma solução definitiva e digna para mais de uma centena de famílias na região de Brasilândia de Minas. Longe dos ritos litigiosos que marcam grande parte dos processos judiciais, a resolução foi alcançada por meio de um diálogo contínuo e da atuação estratégica da Comissão Regional de Soluções Fundiárias do Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF6), estimulada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e em parceria com a comissão análoga do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, demonstrando o poder da cooperação interinstitucional e a capacidade do Poder Judiciário de se aproximar dos cidadãos mais vulneráveis, garantindo-lhes não apenas a posse da terra, mas a plenitude da cidadania.

Cinco homens, todos vestidos com trajes formais, estão posando em pé em um ambiente interno. No centro, há uma pequena mesa de madeira clara com alguns documentos. O fundo é dominado por uma grande mesa de madeira escura e uma parede de madeira onde se lê "PLENÁRIO ELZA ESTRELA MONTEIRO".

A homologação do acordo em Brasilândia de Minas não é apenas o encerramento de mais um processo: é a materialização de uma nova abordagem para conflitos fundiários no Brasil. Segundo o presidente do TRF6, desembargador federal Vallisney Oliveira, tanto o Tribunal quanto a Comissão tiveram “um resultado expressivo nessa causa, porque às vezes o juiz, que tem diversos processos, não consegue dar conta de uma conciliação, que requer muito tempo. É com a estrutura de diversas pessoas envolvidas, como TJMG, Incra, Codevasf, os posseiros e nós, por meio da Comissão de Conflitos Fundiários, que conseguimos, em um ano, fazer uma audiência homologatória de conciliação e extinguir esse processo”.

Um close-up de um homem, vestido com traje formal (terno e gravata), enquanto fala ao microfone. Ele está em um púlpito de madeira. O fundo é simples, consistindo em uma parede branca e um revestimento de madeira na lateral, destacando o orador.

A complexidade do caso envolvia múltiplas partes: o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf). O conselheiro do CNJ e presidente da Comissão Nacional de Soluções Fundiárias, José Rotondano, enfatizou o caráter transformador da decisão: “O momento é histórico e é a concretização de um sonho dessas famílias. Representa a oportunidade de se tirar pessoas da invisibilidade e é uma demonstração inequívoca de que o Poder Judiciário cuida de gente e está próximo da comunidade, especialmente dos mais vulneráveis, saindo dos gabinetes e encontrando as pessoas que mais necessitam do seu apoio”. Ele destacou, ainda, que o processo já durava mais de 16 anos, e foi resolvido em uma audiência simples, mas de grande significado para todas as partes envolvidas.

Um close-up de um homem sorrindo, vestido com traje formal, enquanto fala ao microfone em um púlpito de madeira. Ele está gesticulando com a mão direita. O fundo é simples, com uma parede branca e um painel de madeira à direita, onde um alto-falante escuro está embutido.

Cooperação Interinstitucional e a Paz no Campo

Um dos pilares para o sucesso em Brasilândia de Minas foi a cooperação exemplar entre os diferentes órgãos do Poder Judiciário. O desembargador federal e presidente da Comissão Regional de Soluções Fundiárias do TRF6, Prado de Vasconcelos, salientou a importância de reconhecer o problema fundiário em Minas Gerais e a atuação para solucioná-lo de forma consensual.

Um close-up de um homem de óculos, vestido com traje formal, enquanto fala em um púlpito de madeira. Ele está posicionado em frente a uma parede branca lisa. Um alto-falante escuro está visível no painel de madeira à direita.

“Hoje foi o ápice desse primeiro momento. A primeira ação que a gente está chegando ao fim. Minas Gerais dá o exemplo, com o apoio do Tribunal de Justiça, do Tribunal Regional Federal da 6ª Região, cooperando para a prestação jurisdicional. Não existe o jurisdicionado federal, não existe o jurisdicionado estadual, existe o jurisdicionado mineiro”, afirmou Prado de Vasconcelos. A meta é clara: atuação conjunta entre as diversas forças do Poder Judiciário para solucionar os processos da melhor forma possível, levando paz aos conflitos do campo e garantindo que nenhum cidadão e cidadã esteja invisibilizado em nossa sociedade. “Não podemos ter cidadãos à margem das propriedades, cidadãos à margem das rodovias, cidadãos à margem da cidadania. Nós precisamos ter cidadãos dentro da cidadania e que se reconheçam como brasileiros, destinatários que são das normas escritas na nossa Constituição", finalizou o desembargador federal.

Um close-up de um homem, vestido com traje formal (terno e gravata), falando em um microfone de mesa. Ele está em um ambiente interno com painéis de madeira clara no fundo. À direita, é possível ver duas bandeiras hasteadas.

O juiz federal Mario de Paula Franco Junior, designado para a condução do processo há pouco mais de um ano, em um contexto de cobrança por uma resposta efetiva do CNJ com a instalação do TRF6, descreveu o desafio: “Era uma ação possessória que envolve um conflito fundiário coletivo de grande repercussão aqui no Noroeste de Minas, especificamente aqui em Brasilândia de Minas, e que já estava desde 2016 em tramitação. Em pouco mais de um ano, alcançamos a solução definitiva para esse processo que envolve mais de 100 famílias”. A solução prática é a posse e a propriedade da área, que transferida ao Incra; o órgão federal, por sua vez, realizará o projeto de reassentamento das famílias de acordo com a legislação. Isso significa que as famílias, antes sob risco de reintegração de posse, agora têm a certeza que poderão exercer suas atividades e plantações nas terras que lhes pertencem.

Um close-up de um homem maduro, vestido com traje formal (terno e gravata), em um púlpito de madeira. Ele está em um ambiente interno.

O desembargador e coordenador da Comissão de Solução de Conflitos Fundiários do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) e membro da Comissão Nacional do CNJ, Leopoldo Mameluque, corroborou a singularidade do acordo: “É a primeira vez que um acordo é homologado através de dois tribunais, resolvendo um problema que se arrasta há mais de dez anos aqui na região. Dá dignidade a esse pessoal que ocupava a área, não é uma invasão, é ocupação para moradia, foi solucionado da melhor forma possível. A proprietária da área, que é a Codevasf, reconheceu isso, e transferiu a propriedade do território para o Incra”.

Conquista da terra e da tranquilidade

Para as famílias, o acordo representa uma mudança de vida radical. O representante da Associação Osvaldo Vieira, Amarozan Gonçalves dos Reis, descreveu o dia como um “momento histórico: a justiça hoje deu fim a um processo de desocupação, passando essa terra para o Incra, para que possa ser implantado ali a partir de agora o assentamento, após uma história longa e com bastante dificuldade”. Ele afirma que os trabalhadores da região tiram seu sustento da terra, produzindo leite, mandioca, rapadura, que são comercializados na feira livre da cidade.

Outro beneficiado pelo acordo, Antônio Adilson Rocha Silva, expressou a importância da conquista. Ele e sua família estão há nove anos trabalhando na terra, e agora têm a oportunidade de ter um pedaço próprio. “Podemos criar um porquinho, umas galinhas, uma vaca de leite, criar um cavalo, um alimento, tirar o sustento da família, né? Agora foi normalizado, né? E pode trabalhar com mais tranquilidade, graças a Deus”, afirma o produtor rural, ressaltando ainda a vantagem da proximidade com a cidade e com a escola.

Quem também se emocionou com o fim do conflito homologado pela Justiça foi a presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Brasilândia, Dona Maria, que acompanha a luta desde 1997 e já ajudou a criar cinco assentamentos no município. “Nós estamos lutando por esse assentamento Codevasf desde 2016, quando foi feita a ocupação, porque a terra estava largada, estava abandonada. Nós estamos plantando, estão colhendo, estamos tirando o sustento. O dia de hoje, pra mim, vai ficar na história”.

Ela relata a sensação de ter a propriedade da terra, devidamente regulamentada: “Nossa, é tudo de bom! Você ter um documento na mão, você fazer um financiamento até pra você requerer um benefício do INSS… às vezes o trabalhador trabalha a vida inteira, e quando é a hora de aposentar ele tem que ficar se humilhando para o próprio patrão, e o patrão as vezes não quer nem fornecer, sabe? Porque ele trabalha informal, não tem uma carteira assinada, precisa do Incra, precisa de um documento pra provar que ele é um trabalhador rural e não tem como provar, agora ele vai ter. Agora, nós estamos tranquilos, nós vamos dormir tranquilo se Deus quiser”.

Este acordo em Brasilândia de Minas se estabelece como um modelo para a resolução de conflitos fundiários no país, reafirmando o compromisso do Poder Judiciário com a justiça social e a dignidade humana, através da conciliação e da cooperação entre suas diversas esferas.

Confira abaixo a galeria de fotos do evento.

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