Jornal Estado de Minas entrevista o desembargador federal Vallisney Oliveira, presidente do TRF6

O desembargador federal Vallisney Oliveira, presidente do Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF6), detalha em entrevista exclusiva os desafios de liderar o tribunal mais jovem do país — que já nasceu grande — e os avanços conquistados em apenas três anos, como o Tribunal Itinerante e as unidades avançadas de atendimento. Confira abaixo:


O TRF-6 após três anos

Os desafios de quem dirige o tribunal mais jovem do país, mas que já nasceu grande. O desembargador Vallisney Oliveira, presidente do Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF-6) é o maestro de um grupo de desembargadores que têm na superação sua marca registrada. Mais de 200 mil recursos recebidos para serem julgados sem estrutura, equipamentos ou ferramentas de informática necessários. A desembargadora Mônica Sifuentes foi a primeira timoneira e, agora, Vallisney chega à metade do seu mandato. Em três anos muito se evoluiu, muito se conquistou: o tribunal itinerante já teve 34 sessões no interior do estado das 90 que o atual presidente espera realizar até o final do seu mandato, além da implantação de unidades avançadas de atendimento e de 12 mil processos julgados por cada desembargador. As metas ainda são muitas, mas a certeza de que se está no caminho certo fica evidente nesta entrevista exclusiva.

O Sr. foi o segundo presidente do TRF-6, estando à frente do tribunal mais jovem do país desde agosto de 2024. O TRF-6 já nasceu grande com um acervo inicial de 191.180 processos para serem julgados. Como está o acervo do TRF-6, atualmente? Quantos processos originários e recursos já chegaram ao tribunal em 2025?

A Constituição de 1988 criou inicialmente cinco tribunais regionais federais no lugar do único Tribunal Federal de Recursos, sediado em Brasília, e estabeleceu a possibilidade de instalação de diversos outros tribunais federais no decorrer dos anos. No entanto, passados mais de três décadas, só após grande luta de muitos, apenas uma corte brasileira foi criada, que foi o tribunal de Minas Gerais, em 2022. Entendeu-se a necessidade e a premência da criação dessa Corte Federal, em razão dos milhares de recursos de Minas Gerais que eram processados em Brasília, no TRF-1, e da distância e da dificuldade de se gerir da capital da República esses milhares de processos vindos das varas no interior e da capital de Minas. Ao todo, o TRF-6 herdou mais de 200 mil recursos, mas a cada dia reduz esse número, sem deixar de processar e julgar os novos processos que aportaram na Corte desde agosto de 2022. É um trabalho incessante e comprometido, tanto de magistrados, quanto de servidores e colaboradores. É visível essa redução do acervo. Inicialmente, havia uma relação de mais ou menos 13 mil processos por desembargador do TRF-6, ao passo que hoje essa média foi reduzida para 7 mil recursos, aproximadamente, por cada magistrada e magistrado do tribunal. É falácia dizer que juiz trabalha pouco; com o processo eletrônico, o juiz trabalha toda hora e de qualquer lugar, principalmente pelas liminares e tutelas urgentíssimas solicitadas e pelo assustador volume de causas que requerem decisão inadiável.

O TRF-6 completou três anos no último mês de agosto. No início do seu funcionamento, houve até mesmo problema com a migração dos processos via sistema. Quais as principais dificuldades foram superadas nesses três anos de atividades?

A superação é uma palavra muito utilizada no cotidiano do tribunal, porque o TRF-6 surgiu sem qualquer aumento de despesas e se fez com o que se tinha e era possível. A criação do tribunal consistiu basicamente na posse de 18 desembargadores federais. O resto, praticamente, ficou por conta da força de trabalho da Justiça Mineira Federal de primeira instância que existe há bastante tempo. Além disso, o tribunal foi criado sem ter uma base informatizada judicial própria, segura e funcional; até o final de 2022 o sistema processual travava constante e imprevisivelmente durante o correr dos prazos; os advogados e demais usuários reclamavam, era um caos, que foi sendo resolvido aos poucos. Além da inviabilidade e dos problemas no sistema eletrônico havia falta de pessoal e de tecnologia, havia falta de quase tudo, eramos o tribunal da carência. Só não havia falta de espaço de trabalho, pelo fato de a Justiça Federal de Primeiro Grau em Belo Horizonte ter cedido um edifício para funcionamento do tribunal. No decorrer desses três anos cada dia é uma conquista a ser comemorada. Liderados pela então presidente Mônica Sifuentes mudamos de sistema processual, abandonando o problemático sistema judicial PJE e iniciamos a implantação do sistema EPROC. A partir dessa opção demorou um bom tempo para adquirirmos as ferramentas e os recursos necessários para a aquisição dos equipamentos, para treinamento das equipes e para migrarmos os processos de um para outro sistema. Hoje, a realidade é favorável. Elogiado pelos advogados, o EPROC se mostrou um sistema judicial inovador, com capacidade suficiente para gerir o procedimento eletrônico de mais de um milhão de causas na Justiça Federal de primeiro e segundo graus de Minas Gerais. Quanto ao pessoal, estamos caminhando para a solução a médio prazo com a finalização do concurso para servidores do TRF-6.

O Sr. considera que, hoje, o TRF-6 já possui uma estrutura adequada e bem dimensionada para atendimento das necessidades do jurisdicionado? O que ainda falta para que a prestação jurisdicional seja mais célere e eficaz?

Quanto à estrutura predial, a situação no início era estável: três prédios comportavam a Justiça Federal de Belo Horizonte e o TRF-6. Mas uma situação inesperada, de força maior, alterou essa dinâmica. Em 2024, um acidente seguido de outro em elevadores de dois dos três edifícios, já muito antigos, da Justiça Federal de Belo Horizonte, levou à adoção de medidas drásticas de segurança, tais como proibir o uso dos elevadores nos prédios e permitir o teletrabalho, situação que perdurou por meses num dos prédios, estando o outro prédio ainda em processo de reparo dos três elevadores que foram danificados com a queda. Essa situação criou uma necessidade atual urgente de buscarmos edifícios para o tribunal e para a Justiça Federal em Belo Horizonte, a fim de que todos os serviços da Justiça Federal possam funcionar de maneira acessível e adequada. Hoje temos ainda falta de prédio e de pessoal, mas não falta vontade de trabalho e criatividade dos servidores e magistrados do TRF-6, porque a quantidade e a qualidade dos serviços judiciais crescem a cada dia.

Quantos processos o TRF-6 julgou nesses três anos de funcionamento? E como a inteligência artificial (IA) colaborou com esse desempenho?

Apesar de ser, comparativamente aos demais tribunais, ainda deficitário quanto ao número de assessores e servidores de apoio, o TRF-6 tem uma boa produtividade. Desde agosto de 2022 até agosto de 2025 julgamos mais de 200 mil processos, numa média por julgador de aproximadamente 12 mil processos nesses três anos. A inteligência artificial ainda é uma ferramenta nova no Judiciário, mas já é utilizada por muitos magistrados e assessores de gabinetes, com a tendência de crescimento e influência no bom desempenho judicial. Apesar da carência de servidores na área de tecnologia e insuficiência de recursos para investir maciçamente nesse setor, o tribunal apoia e tem projetos a serem executados no próximo ano para estender o uso da IA para diversos serviços da Sexta Região.

O TRF-6 está, neste momento, realizando um concurso para provimento de cargos de juízes federais substitutos, tendo a primeira prova ocorrido no último dia 23 de novembro. Quantas vagas devem ser preenchidas com esse concurso e qual sua expectativa da contribuição desse concurso em relação à prestação jurisdicional e para a atuação dos magistrados?

A criação do TRF-6 em 2022 e a aposentadoria de alguns magistrados federais acarretou um déficit de mais de 28 vagas, que foram abertas para o primeiro concurso público de provas e títulos para o provimento do cargo de juiz federal substituto do TRF-6, conduzido por uma comissão do próprio tribunal, à frente das desembargadoras Simone Lemos e Luciana Pinheiro. Esse concurso, cuja primeira fase já foi realizada, é um marco histórico para a Justiça Federal mineira, porque é o primeiro concurso de magistrado federal da 6ª Região. Mas tornar-se juiz federal é uma longa caminhada. Serão muitas etapas de provas e depois ainda haverá um curso de formação obrigatório na Escola de Magistratura da 6ª Região, de modo que os novos juízes serão nomeados possivelmente no final do segundo semestre de 2026 ou no início de 2027.

No mês de janeiro entra em vigor a Reforma Tributária e a expectativa é que ocorra um enorme volume de ações, inclusive envolvendo matéria federal, sobretudo no período de transição, em que os dois sistemas tributários, o atual e o novo, serão aplicados simultaneamente. O TRF-6 está se preparando em relação à Reforma Tributária? Há um grupo de trabalho dedicado a ela? A Justiça Federal mineira estará pronta para receber esse aumento de volume sobre temas novos surgidos com a Reforma Tributária?

Os magistrados não estão alheios às transformações legislativas que impactam a atuação da Justiça, entre elas a Reforma Tributária introduzida pela Emenda Constitucional nº 132/23, inclusive ao longo deste ano foram promovidos seminários e grupos de trabalho em diversos níveis e setores, dada a importância do novo modelo cuja implementação ocorrerá de forma progressiva a partir de janeiro e que conviverá com o sistema atual durante período de transição. E o TRF-6 se empenhará em assegurar que a Justiça Federal em Minas Gerais esteja preparada para receber e julgar, com qualidade, celeridade e segurança jurídica, as novas demandas decorrentes da Reforma Tributária.

Quais as metas considera já cumpridas em seu primeiro ano de mandato e o que pretende ainda realizar até deixar a presidência em agosto de 2026?

Estar hoje na presidência deste Tribunal Federal é uma grande honra e uma grande responsabilidade. Já se passou um ano e outro passará rapidamente pois, como se diz, o 'tempo voa' e 'a gente não o pega'. Nesse primeiro anuênio procuramos dar continuidade ao trabalho da primeira presidência do TRF-6 e contribuir para o cumprimento de metas e projetos a serem implementados no presente e no futuro, dentre os quais a instalação de Unidades Avançadas de Atendimento visando diminuir a competência delegada da Justiça Estadual e interiorizar ainda mais a Justiça Federal. Neste primeiro anuênio, também procuramos reduzir o acervo dos recursos extraordinários e especiais de competência exclusiva do presidente do Tribunal; concluímos e migramos todos os processos para o EPROC e implantamos os sistemas de jurisprudência e de estatística do tribunal, demos posse a novos servidores, dentre outras tarefas que procuramos realizar como dever e missão de fé, contando sempre com apoio de magistradas e magistrados, servidoras e servidores do TRF-6.

Recentemente, o TRF-6 passou pela correição ordinária da Corregedoria Geral da Justiça Federal. O resultado foi o esperado? Quais os pontos positivos e negativos levantados?

A Corregedoria do Conselho da Justiça Federal em Brasília é o órgão que fiscaliza e analisa os serviços administrativos e judiciais do TRF-6, fazendo inspeção in loco todos os anos. Na última, realizada em 2025, ficamos muito satisfeitos com os resultados apresentados e aprovados pela Corregedoria-Geral da Justiça Federal. O relatório correicional do CJF destacou pontos positivos, como a alta produtividade, de mais de 142% e a redução de 15% do acervo em apenas um ano. Também foram reconhecidas boas práticas, como o Tribunal Itinerante, as Unidades Avançadas de Atendimento e os avanços em tecnologia e gestão de dados. Por outro lado, a inspeção apontou dificuldades e desafios que teremos que enfrentar, como o acervo antigo de processos e a necessidade de equalizar o desempenho entre gabinetes dos desembargadores. Em síntese, a fiscalização desse Conselho Superior da Justiça Federal concluiu que o TRF-6, um tribunal com apenas três anos, mesmo tendo pontos negativos a serem superados, tem mostrado capacidade de inovação, eficiência e compromisso com a sociedade.

Fonte: Jornal Estado de Minas

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