Na manhã desta sexta-feira (25/10/2024), foi assinado o Acordo de Repactuação do Termo de Transação de Ajustamento de Conduta de Mariana. O novo acordo tem como objetivo reparar os danos causados pelo rompimento da barragem da mineradora Samarco (em 2015) na cidade histórica de Mariana, em Minas Gerais, renegociando um acordo firmado originalmente em 2016 pelas mineradoras. No total, serão R$ 132 bilhões em novos recursos, sendo R$ 100 bilhões a serem realizados pelo Poder Público e R$ 32 bilhões de investimentos das mineradoras. Desses, mais de R$ 81 bilhões serão utilizados em Minas Gerais. A assinatura ocorreu no Salão Oeste do Palácio do Planalto e o advogado-geral da União, Jorge Messias, abriu o evento.
O presidente do Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF6), desembargador federal Vallisney Oliveira; o vice-presidente do TRF6, desembargador federal Ricardo Machado Rabelo; a desembargadora federal do TRF6, Mônica Sifuentes; a desembargadora federal do TRF6, Simone Lemos; o juiz federal Daniel Castelo Branco; a chefe de gabinete da vice-presidência do TRF6, Renata Pimenta e a diretora da Coordenadoria de Solução Adequada de Controvérsias (Cojus), Ana Carolina Ramos Jorge participaram da solenidade.
A assinatura do acordo contou com a presença do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva; do governador de Minas Gerais, Romeu Zema; do presidente da Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais, Tadeu Leite; do governador do Espírito Santo, Renato Casagrande e também de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), ministros de Estado, governadores, autoridades, representantes da sociedade civil e os presidentes da Vale e da BHP Billiton.
Histórico das negociações
O procurador-geral de Justiça de Minas Gerais, Jarbas Soares Júnior, relatou que o processo de repactuação está sendo discutido desde 2021, quando o ministro Luiz Fux, presidente do STF à época entendeu que era preciso haver mediação. “De lá pra cá, muitos foram os que se dedicaram à conclusão desta negociação, anônimos ou não, especialmente a desembargadora do TRF6, Mônica Sifuentes, e o desembargador Ricardo Machado Rabelo, aqui já enaltecidos pelo presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso”, comentou o procurador Jarbas Soares. “O acordo assinado anteriormente não contou com a assinatura dos Ministérios Públicos estaduais e federal, então tinha tudo para dar errado, e deu. Ao final, todos os envolvidos não estavam satisfeitos. Então esse é um novo pacto, um recomeço”, completou Jarbas Soares.
Em seguida, o presidente do TRF6, desembargador Vallisney Oliveira, observou estar feliz em estar presente nesse momento histórico para a Justiça brasileira. “Passados 9 anos, chegamos aqui para a assinatura de um acordo que terá um efeito muito positivo para toda a sociedade de Minas Gerais e do Espírito Santo, especialmente para os diretamente atingidos. Quero registrar que o TRF6 foi muito feliz ao ter um conciliador nato na liderança da repactuação, o desembargador Ricardo Rabelo, que na época contou com a ajuda da desembargadora Mônica Sifuentes, com todo o incentivo do Tribunal Regional Federal. Esses processos poderiam estar na Justiça Federal em diversas instâncias, como de fato estiveram, mas, ao optarmos pela repactuação, temos que pensar que nossa Justiça precisa ser repensada. Nossa Justiça brasileira precisa melhorar em celeridade e efetividade. Por que optamos pela conciliação se isso já poderia ter sido resolvido pela Justiça? A conciliação, que deveria ser alternativa, passa ser a via principal. Quando optamos pela conciliação, nós de certo modo damos um atestado de dificuldades em nossa Justiça brasileira. O poder Judiciário precisa pensar nisso. Quero apenas dizer que nossa Justiça brasileira precisa mudar e estar preparada para resolver questões com rapidez. Mas ganhamos aqui com a conciliação. Espero que saiamos daqui sem precisar de uma outra repactuação. Parabéns a todos os envolvidos para chegar a esse acordo, parabéns ao ministro Jorge Messias que esteve tão empenhado durante mais de um ano nessa luta da repactuação, parabéns ao governo federal que, ao se unir, promoveu a repactuação, ao ministério público federal, às empresas envolvidas e a todos que participaram”, afirmou o presidente do TRF6.
O desembargador Ricardo Rabelo, que esteve à frente das negociações, agradeceu a todos os que participaram da repactuação. “Quando coube a mim a relatoria dos processos do caso de Mariana, junto ao TRF6, e vendo ali uma judicialização excessiva, então resolvi abrir a mesa de repactuação. O que eu fiz nesse um ano e meio de trabalho foi aproximar o poder público e as empresas para uma grande conciliação. Foi um grande aprendizado, foram momentos difíceis. Mas foram os momentos possíveis porque eu sabia que a conciliação era a única resposta para colocar um fim a esse caso de Mariana. E foram infindáveis reuniões, de manhã, de tarde e de noite, e também nos finais de semana. Enfim, vivi o caso de Mariana no último um ano e meio muito intensamente. Eu falo que Mariana roubou os meus pensamentos. Mas hoje estamos aqui celebrando e comemorando. É uma alegria muito grande para mim estar aqui e por ter conduzido esse processo de mediação. Agradeço aos advogados, representantes do poder público, a todos que, de uma forma ou de outra auxiliaram esse processo de conciliação. Acredito na conciliação como instrumento para realização da Justiça e para o alcance da paz social”, finalizou Rabelo.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em seu discurso, comentou que foi feita a Justiça possível, e que nem sempre, quando ele foi sindicalista, ele conseguia acordos com os quais ele concordava totalmente. “Agradeço a todos que participaram desse processo. Quero me dirigir primeiro ao movimento social que tanto brigou por esse processo, aqueles que representam os pescadores, os atingidos por barragens, os indígenas, as mulheres, os quilombolas, os prefeitos da região. Eu fui por muito tempo dirigente sindical, e parte de minha vida foi definida por conclusões de acordos. Muitas vezes o acordo que eu assinava e levava para minha categoria aprovar, eu mesmo não estava 100% de acordo. O que me fazia fazer o acordo era a certeza da importância do momento político e a certeza de que aquele acordo era melhor do que se a gente entrasse numa guerra e não tivesse o acordo. Embora esse acordo tenha a cifra de R$170 bilhões, talvez o maior acordo já feito na história moderna do capitalismo, é importante a gente lembrar que ainda não sabemos o que foi feito com o gasto da fundação Renova que foi criada para cuidar disso. Esse é o dado concreto. Nem o Ministério Público e nem o governo federal sabem. São R$37 bilhões que não sabemos com o que foi gasto. É importante saber. Mas é o acordo que foi possível, melhor do que o que havia antes de chegarmos à presidência da República. É importante não esquecermos do que aconteceu em Brumadinho. Agradeço a todos os que trabalharam nele. Agora começa a preocupação maior. Espero que as empresas mineradoras tenham aprendido a lição. Ficaria muito mais barato ter evitado a tragédia acontecer. Infinitamente mais barato. Já tive a oportunidade de negociar com a Vale quando ela tinha dono, quando o dono dela era o governo. É muito difícil negociar com uma corporation, que a gente não sabe quem é o dono e que tem muita gente dando palpite. E que o dinheiro que poderia ter evitado a desgraça que aconteceu foi utilizado para pagar dividendos. É preciso mudar essa cultura. É preciso investimentos para melhorar a vida dos humanos. Espero que sirva de lição para todas as mineradoras”, concluiu Lula.
Lula ressaltou que para que o acordo seja colocado em prática são estimados cerca de 20 anos de ações, que vão precisar do envolvimento dos Ministérios, que vão ter que entregar projetos para que as ações de recuperação aconteçam na prática.
Atingidos
Será criado um novo programa de indenizações individuais para a população dos 38 municípios mineiros impactados, inclusive Mariana. O valor por indivíduo será de R$ 35 mil e beneficiará mais de 200 mil pessoas em território mineiro. Os valores são estimados em R$ 10 bilhões para este novo sistema.
Ainda nos 38 municípios atingidos pelo rompimento em Minas Gerais, a população de agricultores e pescadores com residência em até 5 quilômetros das margens do Rio Doce será incluída em um novo programa de transferência de renda. Os novos beneficiários irão receber 1,5 salário-mínimo mensal, por um período de ao menos três anos.