A 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 6ª Região acolheu parcialmente um recurso do Ministério Público Federal para aumentar a pena de um brasileiro radicado em Portugal, condenado em 2023 por triplo feminicídio e tripla ocultação de cadáver. Com isso, a pena original de 36 anos e 10 meses passou para 44 anos e 6 meses de reclusão, em regime fechado, acrescida do pagamento de dias-multa.
A defesa do réu também havia apresentado um recurso pedindo o reconhecimento de que os três feminicídios teriam sido praticados de modo continuado, o que implicaria na diminuição da pena total aplicada. De acordo com o artigo 71 do Código Penal brasileiro, um “crime continuado” existe quando o seu autor pratica duas ou mais ações nas mesmas condições (como tempo, local e maneira de execução), dando a entender que os crimes cometidos após o primeiro seriam continuações deste.
Todavia, o relator que analisou os dois recursos constatou a existência do chamado “crime continuado” somente em relação aos delitos praticados contra L. e T., os quais tinham propósito autônomo e diverso do feminicídio praticado contra a namorada do réu, aplicando em relação a esse terceiro crime a regra do concurso material quando da individualização da pena.
A fração de aumento relativa ao crime continuado foi ainda majorada de 1/6 (um sexto) para 1/4 (um quarto), acolhendo parcialmente o requerimento do Ministério Público.
“(…) constata-se a ocorrência de mais de uma ação em relação a cada resultado naturalístico alcançado (feminicídio de L. e T. e feminicídio de M.), ou seja, a prática de atos independentes e com objetivos diversos, motivo pelo qual deve incidir a regra do concurso material – e não a continuidade delitiva (…) considerando a gravidade dos delitos cometidos, a morte de duas vítimas e a presença de uma circunstância judicial desfavorável (consequências do crime), deve ser reconhecida a continuidade delitiva específica prevista no art. 71, p. único do CP, em relação aos feminicídios cometidos contra L. e T.. Como consequência, é razoável a majoração da pena em 1/4 (um quarto), e não de apenas 1/6 (um sexto), devendo também ser reparada a terceira fase da dosimetria”, concluiu o relator, desembargador federal Klaus Kuschel.
Os três feminicídios foram cometidos no município português de Cascais, a oeste de Lisboa, em fevereiro de 2016. Um pedreiro mineiro que lá vivia desde 2004 assassinou uma moça com quem tinha um caso sem que sua companheira que morava no Brasil soubesse. Diante da possibilidade de sua traição vir a público, o brasileiro decidiu matar não apenas a namorada em Portugal como também a irmã dela e a parceira desta, as quais moravam na mesma casa que ele. Após isso, o réu jogou os cadáveres das três mulheres em uma fossa séptica que existia no seu local de trabalho.
O magistrado ainda manteve a prisão cautelar do réu, uma vez que permanecem inalterados os motivos que ensejaram seu acautelamento, em especial a gravidade concreta dos crimes praticados, aduzindo que “A possibilidade de o réu contactar os familiares das vítimas e a fuga repentina do distrito da culpa também justificam o decreto prisional, denotando que outras medidas previstas no art. 319 do Código de Processo Penal não surtiriam o efeito almejado de impedir a prática de novos crimes, aliado à necessidade de aplicação da lei penal. Não há como ignorar, ainda, a enorme repulsa dos crimes pela comunidade, inclusive internacional, fato que corrobora a imprescindibilidade da medida extrema”.
A apelação criminal foi julgada com outros 885 processos, sendo 869 oriundos do sistema PJe e 16 do sistema eproc. A sessão encerrou-se às 22:30 do dia 22 de maio, após 18 sustentações orais.
Apelação Criminal n. 0005495-13.2017.4.01.3800
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